M. de P. Abreu, E. J. Reis, F. Mamfrim e M. G. C. de CarvalhoM. de P. Abreu, E. J. Reis, F. Mamfrim e M. G. C. de Carvalho
Junho de 2011
Com vários títulos e breves interrupções, de 1898 a 1940, Joseph Phillip Wileman e seus sucessores editaram e publicaram uma revista semanal com informações e estatísticas econômicas e financeiras sobre o Brasil. Pela longa duração da publicação e sobretudo pela riqueza do seu conteúdo estatístico sobre um período que antecede a organização do sistema estatístico nacional, a Coleção Wileman Brazilian Review é fonte de valor inestimável para a história econômica brasileira[1]. O acesso a essa fonte, contudo, era restrito, pois as raras coleções existentes eram incompletas e, particularmente no caso da Biblioteca Nacional, não se encontravam ainda em formato de microfilme ou digital. A digitalização e divulgação em meio eletrônico da coleção pretende superar esses obstáculos, dessa forma possibilitando que a contribuição de Wileman à historiografia econômica brasileira seja devidamente reconhecida[2].
A gestação do projeto de microfilmagem, digitalização e divulgação eletrônica da Coleção Wileman foi longa e tortuosa devido, em parte, às múltiplas atividades paralelas dos pesquisadores envolvidos. No início da década de 1990, no Departamento de Economia da PUC-Rio, o Professor Marcelo de Paiva Abreu deu início ao projeto, buscando identificar e localizar os acervos disponíveis nas diversas bibliotecas.
A partir de meados da década de 1990, Flavia Mamfrim, como assistente do projeto, realizou dezenas de consultas a bibliotecas, em particular na Biblioteca Nacional e na Biblioteca da Fundação Alexandre Gusmão (FUNAG), dando início às gestões para a aquisição dos microfilmes disponíveis comercialmente. Constatando-se que as revistas anteriores a 1915 não haviam sido microfilmadas e que havia incerteza quanto às lacunas, tornou-se claro que a solução ideal passaria pela microfilmagem da coleção da Biblioteca Nacional com as lacunas sendo completadas na medida do possível.
Em 1999-2000, entendimentos entre o Departamento de Economia da PUC-Rio e o Embaixador Álvaro da Costa Franco, diretor do Centro de História e Documentação Diplomática da Fundação Alexandre de Gusmão, resultaram na microfilmagem da coleção pela Fundação Alexandre de Gusmão. Em 2001-2002, os microfilmes foram verificados para identificação de lacunas no Departamento de Economia da PUC-Rio. Lentamente, algumas lacunas foram completadas com microfilmes oriundos de outras bibliotecas, amadurecendo a idéia de tornar a coleção disponível em CD-ROM e em meio eletrônico.
Em 2008, o apoio técnico e financeiro do projeto Memória Estatística do Brasil no Acervo da Biblioteca do Ministério da Fazenda no Rio de Janeiro (Pronex/Cnpq/Faperj ), coordenado por Eustáquio Reis, possibilitou uma parceria entre o Departamento de Economia da PUC-Rio, o IPEA e a Coordenação de Microreprodução da Biblioteca Nacional tendo em vista concluir o preenchimento das lacunas existentes na coleção de microfilmes; realizar a reprodução digital de toda a coleção da revista. Finalmente, em 2011, como bolsista do Programa Nacional de Pesquisa em Desenvolvimento (PNPD/IPEA), a Professora Maria Gabriela de Carvalho, do Departamento de História da PUC, concluiu as tarefas de organização, catalogação e indexação da coleção para divulgação em meio eletrônico.
Apesar dos esforços da equipe, foi impossível localizar exemplares de todos os números publicados na coleção Wileman Brazilian Review. É especialmente lamentável a ausência dos três primeiros números editados por Wileman em 1898. Por referencias posteriores, presume-se que o primeiro número foi publicado em 03.03.1898 e o último em 29.05.1940. Estima-se que, no total, foram publicados cerca de 2.168 números. De alguns números, contudo, só resta a pagina de rosto; de outros, existe apenas a referencia nos números subseqüentes, existindo casos que nem mesmo se sabe ao certo se foram publicados. Por fim, nota-se que algumas vezes ocorrem erros de paginação, numeração e volumes na própria edição das varias revistas. O Anexo I apresenta um índice sumario dos volumes publicados explicitando as principais lacunas. O Anexo II, em planilha à parte, apresenta um índice sumario dos números publicados, apresentando maiores detalhes.
O acervo digital atualmente divulgado no sítio Memória Estatística do Brasil conta 52 volumes anuais, contendo 2.112 números semanais e 46.447 páginas publicadas entre 22.05.1898 e 29.05.1940. As 56 lacunas do acervo digitalizado são identificadas no Anexo II, em planilha à parte. Além dos três primeiros números, as lacunas mais notáveis ocorrem nos volumes de 1914, 1926 e 1927, refletindo, em parte, descontinuidades na própria publicação da revista devido à razões descritas no texto que se segue.
J.P. Wileman: esboço biográfico
Joseph Phillip Wileman nasceu em 18.10.1852, em Uttoxeter, Staffordshire, Grã-Bretanha, foi batizado na Fetter Lane Moravian Church em Chelsea, Londres, em 13.3.1853, e morreu em São Paulo em 18.4.1920. Presume-se que fosse “civil engineer”, tal como indica a folha de rosto de seu livro Brazilian exchange. The study of an inconvertible currency (Buenos Aires, Galli Brothers, 1896, reimpresso pela Greenwood Press, Nova York, 1970, e, on demand, pela Nabu Press, 2010). Seu nome não consta, entretanto, dos arquivos da Institution of Civil Engineers, em Londres.
Sabe-se pouco sobre a sua vida. Há indicações esparsas sobre suas atividades na Argentina, antes da publicação de seu livro. Em 1878, obteve concessão na província de San Luis para a exploração comercial de fornos de fundição de metais. Em 1888, a firma J.P. Wileman & Co., instalada em Buenos produziu panfleto sobre a concessão ferroviária do Ferrocarril Central del Rosário de Santa Fé a Pigüé y General Acha. Na documentação sobre entrada de imigrantes do Arquivo Nacional, constam dois registros de desembarque no Porto do Rio de Janeiro: o primeiro, no navio Patagônia, em 05.09.1885; e o segundo, no Britania, em 02.04.1890; em ambas as vezes, o porto de entrada era Liverpool e a viagem foi de primeira classe, desacompanhada.
O prefácio de seu livro Brazilian Exchange indica que, em 1896, estava baseado no porto do Rio Grande, no Rio Grande do Sul. Não se sabe o que fazia por lá. Seu livro é o primeiro tratamento analítico da história financeira do Brasil, como mostra a comparação com textos contemporâneos tais como, por exemplo, Liberato de Castro Carreira, História financeira e orçamentária do Império do Brasil (Rio de Janeiro, Imprensa Nacional, 1889) e Pandíá Calógeras, La politique monétaire du Brésil (Rio de Janeiro, Imprensa Nacional, 1910). Foi substancial a influência das ideias do seu livro sobre a política econômica adotada por Joaquim Murtinho no quadriênio Campos Salles (1898-1902).
Com a Proclamação da República foi descontinuada a publicação das estatísticas referentes ao comércio exterior do Brasil, embora existissem dados para alguns portos. O ministro da Fazenda, Joaquim Murtinho, pelo decreto 3547 de 8.1.1900, criou um serviço de estatística comercial na Alfândega do Rio de Janeiro e imediatamente nomeou J.P. Wileman seu diretor (“que serve gratuitamente”). As estatísticas comerciais voltaram a ser publicadas a partir de 1900 e Wileman continuou no cargo até 1908. Logo em seguida, Wileman publicou duas edições do Brazilian Yearbook (1908 e 1909), com descrições bastante detalhadas da economia brasileira no período.
Em 1898, Wileman fundou um periódico econômico semanal que seria publicado quase que ininterruptamente até 1940 sob vários títulos. Entre 1898 e 1910, foi publicado como The Brazilian Review. A Weekly Record of Trade and Finance e depois de 1910 como The Brazilian Review. Em fevereiro de 1912, Wileman, com a saúde abalada, vendeu a revista para W.G. Chancellor e, a partir de 25.6.1912, passou a assinar um suplemento intitulado Mostly about Coffee que integrava a revista.
Quando The Brazilian Review deixou de ser publicada em 1914 (23.1.1914), Wileman fez circular Mostly about Coffee de forma independente e gratuita (48 números) para os assinantes da The Brazilian Review durante todo o ano de 1914. No início de 1915, Wileman pretendeu lançar uma revista semanal similar à Brazilian Review com o nome de The New Brazilian Review. Só um número da revista circulou, em 5.1.1915, em vista de problemas legais quanto ao direito ao título. O nome foi temporariamente alterado para Wileman´s Review. A Journal of Trade and Finance até que J.P. Wileman assegurasse seus direitos e, a partir de 23.5.1915, a publicação teve o título Wileman´s Brazilian Review. A Journal of Trade and Finance cuja circulação foi interrompida durante a Segunda Guerra Mundial.
J.P. Wileman foi sucedido como editor por seu filho, Henrique Frederico Wileman, em 1920. No final de 1930, a publicação da revista foi suspensa, devido a problemas com a censura, e só retomada no início de 1931. Henrique Frederico Wileman morreu, aos 45 anos, em 19.5.1933, e foi enterrado no cemitério dos Ingleses, na Gamboa, no Rio de Janeiro. Com a sua doença e morte, a publicação da revista ficou interrompida a partir de 18.3.1933. Foi retomada em 7.8.1933 após a compra por L. St John Courtney, que foi seu também seu editor até 15.10.1934. Courtney foi sucedido como editor por Oscar Loup (22.10.1934-26.11.1935) e em 10.1.1935 vendeu a revista para Herbert Brabner. Os dois últimos editores foram V.S. Coelho (2.12.1935-28.12.1936) e Arthur F. Braga (4.1937-29.4.1940?). A interrupção talvez tenha sido de fato em novembro de 1940. Há registro de uma fracassada tentativa de relançamento entre abril e julho de 1941.
Agradecimentos
Pelo Departamento de Economia da PUC-Rio agradecimentos são devidos ao Embaixador Álvaro da Costa Franco, diretor do Centro de História e Documentação Diplomática da Fundação Alexandre de Gusmão, pelo empréstimo de microfilmes para identificação de lacunas; a Pedro Carvalho de Souza, pela elucidação da misteriosa troca de nomes das publicações editadas por J.P. Wileman em 1915; a Wilmann Bevolley, pela verificação das lacunas no conjunto de microfilmes realizados na Biblioteca Nacional pela Fundação Alexandre de Gusmão.
Na Biblioteca Nacional, agradecemos à Vera Lúcia Garcia Menezes, chefe da Coordenação de Microreprodução cuja receptividade e apoio permitindo o acesso ao acervo de microfilmes e disponibilizando os recursos técnicos necessários, foram fundamentais para viabilizar a reprodução digital da coleção de microfilmes; e também a Marcel Rodrigues Carreira e Ana Maria Silva Sanches pela excelência e rapidez dos trabalhos de reprodução digital.
No IPEA, somos imensamente gratos a Jorge Morandi, coordenador área de informática do IPEA, no Rio de Janeiro, que com seu entusiasmo, generosidade, empenho e conhecimento técnico, foi sempre o grande parceiro do projeto Memória Estatística do Brasil, sendo responsável por todas as atividades relacionadas à informatização e disponibilização eletrônica do acervo; e a Pérsio Davidson, chefe de gabinete da Presidência do IPEA, cujo apoio foi fundamental para a obtenção de uma bolsa de estudos do PNPD.
Na Biblioteca do Ministério da Fazenda no Rio de Janeiro, agradecemos Kátia Oliveira e Vera Guilhon, bibliotecárias chefe e adjunta, respectivamente, que acolheram e apoiaram com entusiasmo e generosidade o projeto Memória Estatística do Brasil, cedendo-nos sua capacitação e conhecimentos técnicos da Biblioteca do Ministério da Fazenda, bem como as acomodações físicas do projeto, e sobretudo o empenho para superar vários obstáculos técnicos e administrativos ao longo de todos esses anos; e também a Vitor Hugo Correa por seu diligente trabalho de estagiário.
' Por fim, registramos nossa gratidão ao IPEA pela bolsa do PNPD e ao CNPq e à FAPERJ pelos vários financiamentos concedidos ao Projeto Memória Estatística do Brasil.
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[1] Duas fontes estatísticas contemporâneas são Relatorio da Camara Syndical dos Corretores de Fundos Publicos da Capital Federal, [1891-1945], 37 v. e Retrospecto commercial do Jornal do Commercio [1874-1937], Rio de Janeiro: Typographia Imperial e Constitucional de J. Villeneuve & C.; Typographia do Jornal do Commercio de Rodrigues & C. 61 v.
2] Além de editar a revista semanal e os Brazilian Yearbook dos anos de 1908 e, Wileman publicou também Brazilian Exchange : the study of an inconvertible currency (Buenos Aires: Galli Bros.,1896) As referências feitas por Celso Furtado em seu Formação Econômica do Brasil (Rio de Janeiro, Fundo de Cultura, 1959) a essa obra despertaram o interesse por Wileman entre os estudiosos da história econômica brasileira e, desde então, encontram-se referências esparsas às duas edições do Brazilian Yearbook e às revistas editadas por Wileman.